A POESIA NÃO SE ENAMORA NUNCA
A meus filhos,
discípulos e afins I
Não me
fazei correr vossas carreiras
nem me fazei voar em vossos vôos
nem me fazei fazer vossos trabalhos
nem, tampouco, amar vossos amores.
Eu, filhos
meus, com paixão, os transportei
voando, sempre, a vosso lado,
desde os confins quietos da família
até as portas em liberdade do mundo.
Agora
começa vossa viagem
e, se os deixo partir sem acompanhá-los,
é porque eu tenho minha própria viagem.
Devo por no caminho que construí
com minha própria vida e escrevendo,
meu nome, meu sobrenome, minhas marcas,
minhas senhas pessoais que são a poesia.
No caminho
encontrareis o ouro e a pobreza,
os precipícios fundos e as grandes planícies.
Haverá em vossos caminhos, não o duvideis,
emboscadas, traições, vis injustiças,
por isso é conveniente viajar acompanhado.
E quando
consigais algo de pão, algo de dinheiro,
tentai reparti-lo o melhor possível entre todos.
Alguém que comeu
e tem dinheiro para o pão da manhã
em algo se sentirá feliz e seu trabalho
não será dirigido pela fome ou o ódio
senão pelo amor ou pela liberdade.
E este é o
verso onde tentarei
deixar-lhes o ensinamento mais necessária:
Em uma
sociedade justa, o trabalho é um dom:
uma
alegria, um bem, humano propriamente,
com a qual se pode modificar o natural,
a vida, os enxames de sonhos, o sol.
Com o trabalho, o homem pode voar sem asas,
navegar pelos mares sem conhecer o mar.
Da árvore estupefata da surpresa diante do homem,
pode o trabalho arrancar uma cadeira e, da pedra,
os sinais que forjam o porvir do homem,
sua casa, seus monumentos, sua própria lápida.
Quero que
sempre leveis a vosso lado
a goiva, a garlopa, o martelo, a foice,
essas frases que servirão até o final,
para limar as asperezas da morte.
E se
alguém lhes perguntasse, para que tanto,
para que tanta paixão posta no trabalho,
vocês respondereis, com velocidade:
para nada, trabalhamos para viver a vida,
trabalhamos para que no humano mundo
haja senhas de que nós estivemos,
criando e trabalhando, talvez, neste mundo,
que fizemos um trabalho para viver, para amar,
para congelar a própria mirada da morte
fizemos um trabalho e escrevemos um verso.
A
mis filhos, discípulos e afins I
POESIA, CARTAS DE AMOR, PSICOANÁLISE,
EROTISMO OU PORNOGRAFIA?
ALGO DE POLÍTICA OU COLETA DE LIXO
E CARTA DO DIRETOR |
AMORES PERDIDOS
OS ÍNDIOS
I
Escrever
um soneto para um índio é coisa fácil.
Ponho aqui uma injustiça, aqui ponho uma burla.
Ponho as tumbas violadas de meus antepassados
e, para terminar este quarteto, uma menina vexada.
Um soneto
não é coisa complicada para um índio,
pontuando, tenho a humilhação de cinco séculos,
na metade, precisa, do que fazer estes versos.
E agora, para fazer o espaço, deixo cair o ouro.
E assim
começa o final destes começos,
por isso ponho aqui o peso duro da carne,
nossos mortos ao defender terra arrebatada.
O corpo da
fertilidade de nossa terra.
O húmus encantado que faz viver o índio,
essa flor sempre-viva, cravada nas Américas.
Amores
perdidos. Os Índios I